Ontem, deparei-me com uma história muito interessante, e até então inédita para mim, sobre o impacto de “Hey Jude” antes mesmo do lançamento do single. Conta como “Hey Jude” ofuscou o lançamento do Beggar’s Banquet (O Banquete dos Mendigos), dos Stones, contada pelo Tony Barrow. Daí, aproveito para contar a estória e lembrar uma ou outra coisinha a mais sobre esta memorável canção, um dos mais belos “filhotes” de Paul.
Era o mês de agosto de 1968. Um dos clubes de sucesso em Londres era o Vesuvio Club. Embora os Fabs não o frequentassem, os donos do clube garantiam o movimento: eram os stones Mick Jagger e Keith Richards, além de um terceiro sócio, Tony Sanchez, que era também gerente do lugar.
Mick Jagger morava na Califórnia, mas decidiu ir a Londres especialmente para fazer uma dupla comemoração no Vesuvio: seu aniversário de 25 anos e o lançamento de “Beggar’s Banquet”, o mais recente álbum dos Stones, aguardado com ansiedade pelo público e pela crítica. E assim foi: o Vesuvio foi preparado para a festa, recebendo a nata do cenário musical da época. A única coisa com que Jagger não contava era que os Beatles, naturalmente convidados, fossem “melar” os planos, ofuscando o que os Stones tinham para mostrar. Ele não podia prever que, no banquete dos Stones, “Hey Jude” acabaria sendo o prato principal!
Apenas John e Paul foram ao Vesuvio naquele dia, e Paul trazia um disco debaixo do braço. Era uma cópia em acetato do mais novo single dos Beatles, com “Hey Jude” e “Revolution”. O single estava prestes a ser lançado, e até então ninguém além dos próprios Beatles e dos poucos privilegiados a compartilhar os estúdios havia escutado “Hey Jude”. Na verdade, ainda não haviam decidido se a música deveria ser lançada naquele formato, pois era considerada excessivamente longa para um single – duvidava-se que os DJs das rádios fossem executar uma faixa de sete minutos. Na época, John estava quase sempre na casa de Paul em Cavendish Avenue, onde foi composta “Hey Jude”, tendo a participação de John apenas no apoio à manutenção do verso “The movement you need is on your shoulder”, que Paul, autor da canção, considerava fraco. Assim, o verso foi mantido e a canção foi gravada entre 29/07 e 02/08 de 1968. Após vários takes feitos apenas com a participação dos Beatles, George Martin assumiu o comando para adicionar a orquestração, que tornaria a faixa realmente longa, uma vez que Paul teve a idéia de pedir aos músicos que o acompanhassem batendo palmas e cantando o “na, na, na, na, na, na, na… na, na, na, na… hey Jude”, refrão que se estende na parte final da música.
Uma vez concluídas a gravação e a mixagem, iniciou-se a polêmica interna sobre o uso de “Hey Jude”. Afinal, era o primeiro single que os Beatles iam lançar com o selo da récem-fundada Apple, e isso representava muito para eles. John e Paul, em fase de intensa “competição” interna, centralizavam as discussões: embora Paul estivesse convencido de que a música, mesmo longa, seria um sucesso, John o questionava, talvez desejoso de que “Revolution”, já gravada, figurasse no lado A do single, conforme planejado inicialmente. No fim das contas, o ponto de vista de Paul acabou prevalecendo: “Hey Jude” ficou com o lado A, “Revolution” com o lado B, e as primeiras prensagens de teste do single foram feitas.
O que nos leva de volta ao Vesuvio Club… lá estavam Paul e John, na festa de lançamento de Beggar’s Banquet. E tudo corria bem, até que Paul, por iniciativa própria (ou seja, sem consultar John, que estava ao seu lado e ficou claramente irritado com a atitude impulsiva de seu partner), pediu ao gerente do clube que tocasse uma inédita dos Beatles. E assim foi feito, e o público da festa foi presenteado com a primeira audição pública de “Hey Jude”! Claro que o efeito foi incrível: a música impressionou a todos e, a pedidos, foi tocada repetidas vezes durante a noite, ofuscando completamente o tema da festa, que eram as músicas do Beggar’s Banquet, dos Stones… (O impacto positivo era tudo que Paul precisava para ratificar sua posição em relação a “Hey Jude”, que manteve-se inalterada em seus 7 minutos e 11 segundos de duração e assegurou de uma vez por todas o lado A do single). Não poderia haver melhor vitrine do que aquela “exibição-teste” improvisada no Vesuvio, já que ali estavam reunidas diversas personalidades do meio musical, além de críticos e jornalistas, que imediatamente espalharam as boas novas: os Beatles tinham uma nova canção, e ela era maravilhosa. Assim, “Hey Jude” obteve ainda mais promoção espontânea, até que fosse lançado oficialmente o single “Hey Jude”/”Revolution” na Inglaterra, em 30 de agosto de 1968.
Como já era de se esperar, “Hey Jude”, a canção cujos versos surgiram pela vontade de Paul em consolar o pequeno Julian Lennon, que sofria com a separação de seus pais, foi mesmo um sucesso: foi número um em diversos países, não somente nos mais óbvios, como Inglaterra e Estados Unidos, mas também na Holanda, Irlanda, Bélgica, Alemanha Ocidental, Noruega e Suécia, e até mesmo nas distantes Nova Zelândia, Malásia e Cingapura. Ah, e pela primeira vez, com esse single, os Beatles alcançavam o topo das paradas no Brasil. E acho que não há mesmo quem resista a cantar junto quando Paul começa aquele “na, na, na, na, na, na, na… na, na, na, na… hey, Jude”.