Assistir a um show de Paul McCartney – mesmo que seja o vigésimo show de Paul McCartney no Brasil, como, de fato, foi este último da perna brasileira de sua turnê Out There – continua sendo uma experiência única, se você souber senti-lo. É como assistir Leonardo da Vinci projetando suas máquinas futuristas ou assistir a Paulo Maluf superfaturando contas: são seres humanos especiais, monumentos da nossa noção de ocidente, com estrelas imensas sobre si, executando seu trabalho com uma maestria que é digna do preço do ingresso em si.
De todas as turnês recentes do ex-beatle, esta fase final de Out There é a que apresentou menor flexibilidade de repertório: sem grandes surpresas como covers de soulmen ou lados b dos Beatles tocados pela primeira vez. No show de ontem, por exemplo, a diferença para o outro show paulista foi mínima: saiu “Eight days a week” e entrou “Magical Mystery Tour”; saiu “Hi hi hi” e voltou “Get back”. Choveu cântaros, tanto quanto no show de terça-feira. E o som estava ótimo, e o telão estava impressionante, e a iluminação estava deslumbrante e, de novo, as 45 mil pessoas presentes nem cantaram, se abraçaram, dançaram, se beijaram, esmurraram o ar e se extasiaram tanto quanto se fosse noite de lua cheia.
Agora, a menos que você seja um dos (muitos) peregrinos que assistiram a todas as apresentações, essa falta de surpresa não faz a menor diferença.
Porque Paul McCartney transmite um prazer, uma entrega, um capricho nos detalhes e um compromisso com o que está fazendo que transforma cada piada ensaiada, cada “Yesterday” cantada de novo e de novo e de novo, cada brincadeira repetida ad-nauseum (como os gestos de desgosto com o barulho de “Live and let die”) em galanteios, em sinal de cumplicidade com o público. Desde que voltou a excursionar pelo mundo, na virada dos anos 1980 para os 1990, McCartney aprendeu a fazer o megashow de estádio com mais cara de show intimista no mundo, segurando 185 mil pessoas (como nesta tour brasileira) com um ukelelê como em “Something”, com um violão folk como em “Blackbird” ou em canções que foram feitas para explorar os limites dos estúdios dos anos 1960 – como “Lovely Rita” ou “Paperback Writer”.
E os shows acabaram criando seus próprios cavalos-de-batalha como “Let me roll it” (um lado b de 1973 que nunca foi grande sucesso no Brasil, mas que ontem era cantada a plenos pulmões pelo público paulista) ou a hardroqueira “Helter Skelter”.
Ele não precisava arriscar, mas incluiu quatro canções de seu álbum New (“Save us”, “New”, “Queeny Eye” e “Everybody Out There”) lançado quando a turnê Out There já estava a pleno vapor e mais uma balada de seu disco de traditional pop, Kisses on the bottom. Todas muito bem recebidas.
Ele também não precisava, mas chamou ao palco um grupo de fãs vestidos de Sgt. Pepper. E ainda tocou durante todo o show com uma das pulseirinhas de elástico feitas pelo menino Matheus Bustamante Bettiato, de 10 anos (Matheus ficou famoso durante a semana por haver juntado R$ 800 vendendo suas pulseiras para comprar ingressos para o show). Muito além da burocracia, não?
Pense nos pares geracionais de Paul McCartney (Rolling Stones? Roberto Carlos?), sobre qual faz valer mais vigorosamente cada centavo do ingresso, qual consegue combinar a maior quantidade de informação nova e ousada, ao mesmo tempo, a maior quantidade de sucessos todo-mundo-junto para o papai-e-o-netinho.
Quer dizer, as modas podem trazer e levar artistas maiores do que Paul e os Beatles. O descompromisso e o virtuosismo podem fazer artistas melhores (ou, no mínimo, que agradem mais ao teu gosto). Mas, definitivamente, não há artista maior e melhor, simultaneamente, do que o beatle Paul.
O set list de 26 de novembro foi o seguinte:
Magical mystery tour
Save us
All my loving
Listen to what the man said
Let me roll it
Paperback writer
My valentine
Nineteen Hundred and Eight Five
The Long and winding road
Maybe I´m amazed
I´ve just seen a face
We can work it out
Another day
And I love her
Blackbird
Here today
New
Queenie eye
Lady Madonna
All together now
Lovely Rita
Everybody out there
Eleanor Rigby
Being for the benefit of Mr Kite
Something
Ob-la-di Ob-la-da
Band on the run
Back in the USSR
Let it be
Live and let die
Hey Jude
Day tripper
Get back
I saw her standing there
Yesterday
Helter Skelter
Golden Slumbers/ Carry that weight/ The End
Não há novas datas agendadas para a turnê Out There – que começou, aliás, no Brasil, em 4 de maio de 2013, no Mineirão e já foi vista por mais de um milhão de pessoas.
Ricardo Alexandre, R7
“Let me roll it” e “Helter Skelter”, ao vivo, são mais que perfeitas!!! Matam a pau!!! o/
O show de Vitória teve 39 músicas. Na minha opinião, isso o faz indiscutivelmente um show melhor que o de SP.