Paul McCartney

Paul McCartney quer cantar até morrer

ÉPOCA – Cobrar um ex-beatle de 69 anos por novidades musicais seria descabido. Para quem, como Paul McCartney, liderou uma revolução no rock e na atitude das décadas de 1960 e 1970, o que mais é preciso provar? Nada. Se parasse de tocar hoje, ou se o tivesse feito dez anos atrás, Paul ainda seria lembrado e celebrado como um dos músicos mais influentes do século XX. Mas, por favor, não digam isso a ele. O compositor das melodias mas bonitas dos Beatles, o dono da voz mais conhecida (e apreciada) do pop mundial, simplesmente não quer parar. “Toda vez que saio em turnê, alguém me pergunta sobre parar”, diz ele, numa chuvosa tarde londrina de janeiro, durante o encontro com a imprensa para a divulgação de seu 15º disco solo. “Eu digo que não pretendo me aposentar e que não sei se vou parar algum dia.” Seria o caso de gritar Beatles 4 ever? ÉPOCA foi a única publicação brasileira convidada para essa conversa, e o público brasileiro faz parte do que Paul diz ser sua dose extra de energia para continuar com turnês mundiais. “Os shows recentes que fiz na América do Sul tiveram uma incrível quantidade de gente, com um astral eletrizante”, diz, sorrindo.

O ex-beatle parece feliz. Em outubro de 2011, Paul (que tem cinco filhos e oito netos) casou-se pela terceira vez, com a nova-iorquina Nancy Shevell. O clima de romance das 14 faixas do novo disco, Kisses on the bottom, pode ter algo a ver com a união, mas Paul explica que o álbum é um resgate pessoal e sentimental de canções que fizeram e fazem parte da história de sua vida. Para quem estiver muito curioso, as músicas já estão disponíveis no iTunes e o álbum chegará às lojas no dia 7 de fevereiro.

Com apenas duas músicas inéditas – “My valentine”, com participação de Eric Clapton, e “Only our hearts”, com Stevie Wonder –, o disco tem regravações de standards dos anos 1930 e 1950, com sonoridade jazzística. Há canções de Sam Cooke (“Home – When shadows falls”), Ella Fitzgerald (“It’s only a paper moon”), Danny Kaye (“The inch worms”) e o sucesso de 1935 do cantor e pianista Fats Waller, “I’m gonna sit right down and write myself a letter”. É de um dos versos dessa faixa que o ex-beatle tirou o divertido título do disco: beijos no traseiro. A letra da canção fala sobre escrever uma carta de amor a si mesmo, com “a lot of kisses on the bottom’’ (muitos beijos no final).
ENTRE AMIGOS Kisses on the bottom tem participação de Diana Krall, Eric Clapton e Stevie Wonder (Foto: Divulgação)ENTRE AMIGOS
Kisses on the bottom tem participação de Diana Krall, Eric Clapton e Stevie Wonder (Foto: Divulgação)

“Eu amo estas canções”, diz Paul. Ele conta que nunca havia concretizado o projeto, pois sempre alguém fazia algo parecido antes. Robbie Williams, Rod Stewart e até Ringo gravaram discos similares. A diferença, diz ele, é o fato de as canções escolhidas não serem tão conhecidas. As memórias que orientaram a escolha das canções vêm desde a infância (quando seu pai tocava ao piano “e a família toda cantava junto”) e chega até as músicas responsáveis pelo início dos Beatles. “Quando conheci John e começamos a tocar juntos, foram essas músicas que fizeram com que nos interessássemos um pelo outro”, diz ele. “Elas traçaram uma direção em comum para as nossas canções.” Segundo Paul, há um pouco delas em canções dos Beatles como “Honey pie”, “Here there and everywhere” e “All my loving”. “São nossas influências. As estruturas das composições minhas e de John eram comparadas às dessas músicas. Fazíamos apenas uma introdução diferente, com pegada rock and roll”, afirma.

O rock está distante do disco. A principal responsável por isso é a cantora, compositora e pianista americana Diana Krall, que participou do projeto e emprestou sua banda para as gravações. Seu jazz-pop percorre todo o disco. “Ela dedilhava um arranjo no piano e já sabíamos o que entrava e o que saía. Nossa conexão foi muito boa, incluindo os feras da banda dela, como o guitarrista John Pizzarelli.” Sobrou para Paul os microfones: ele caprichou a cada faixa, deixando seu lado crooner aflorar. Copiou a leveza de um antigo ídolo, o ator, dançarino e cantor Fred Astaire. “Gostava de imitar a sonoridade de sua voz, que muitos consideravam pequena. Eu me inspirei muito em sua suavidade. Essa técnica acabou dando o tom do álbum”, diz. Alguém poderia dizer que a suavidade, como oposto da estridência, deu o tom elegante que marca toda a carreira de Paul McCartney. Uma carreira que começou em 1960, com a criação dos Beatles, e que, a rigor, nunca deveria acabar.

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