Para a edição comemorativa de dez anos do falecimento de GEORGE HARRISON elaborada pela revista inglesa MOJO, o jornalista Michael Simmons falou com o ex-colega de banda de Harrison, PAUL MCCARTNEY sobre a vida musical dos dois. Enquanto alguns trechos da conversa compõem parte do enorme perfil de George na revista, o que segue abaixo é a tradução de uma compilação confeccionada pelo editor. [Colaboração: Luiz Antonio]
Louise Harrison «irmã de George» me disse que os pais dela os ensinaram a confiar nas pessoas, e que quando George era jovem, ele confiava demais nos outros. Ela deu a entender que isso o tornou vulnerável. Isso procede?
Eu diria que ele estava mais para leal. Confiante? Mmm, eu não sei. A irmã mais velha dele o veria de modo diferente de seus colegas de rua da época. Então depende do que você esteja falando. Se fosse e relação a golpistas, ele com certeza não confiaria e os reconhecia de cara. Mas ele era um cara muito leal; qualquer pessoa da qual ele gostasse tinha sua lealdade. «risos» Mas havia muita coisa na qual ele não confiava. Ele era muito ligeiro. Ele tinha olho clínico pra falsidade.
Anos atrás, dizia-se que John «Lennon» referia-se a George como ‘o garoto’ quando os Beatles começaram e que John tratava como tal. Quanto tempo isso durou?
Durou provavelmente alguns anos. Só por causa da idade dele, em um grupo de homens que cresceram juntos, particularmente durante a adolescência – a idade conta. No caso de John, que era três anos mais velho que George – isso significava muito. John ficava meio envergonhado por ter meio que um ‘moleque’ à sua volta, apenas porque isso acontece em um grupo de caras. Durou pouco. Ficou particularmente perceptível quando George foi deportado de Hamburgo «em novembro de 1960» por ser menor de idade. Além disso, quando ele entrou para o grupo, ele era um menino com rosto de criança. Eu me lembro de apresentá-lo a John e pensar, Wow, há uma diferença de idade. Não vinha muito de minha parte porque eu estava no meio. Mas à medida que crescemos, parou de fazer diferença. E esse tipo de diferença some sozinho.
Tenho curiosidade sobre o processo de George no estúdio. Você se lembra de algum momento mais marcante quando George tenha colaborado com algo ou tenha feito uma música deslanchar?
Ah sim, com certeza. Muitos. Eu pensaria imediatamente em uma música minha ‘And I Love Her’, que eu levei pro estúdio praticamente terminada. Mas George colocou o do-do-do-do «canta o riff característico» que é uma grande parte da música. Você sabe, o riff de abertura. Isso, pra mim, fez uma diferença gritante na música e seja lá quando eu a toque agora, eu me lembro do momento em que George fez isso. A canção não seria a mesma sem ele.
Eu acho que muitos dos solos dele tinham muita personalidade e davam cara aos discos. Ele não soava como nenhum outro guitarrista. Bem no começo, nós éramos muito jovens e não pensávamos de maneira profissional. Nós só éramos garotos sendo levados através dessa terra maravilhosa do ramo musical. Nós não entendíamos como rolava – algo que me deixa feliz porque eu acho que isso significaria que estávamos fingindo algo. Então acabamos fazendo coisas que as pessoas depois imitariam ao invés de nós fingindo algo porque nos disseram para fazê-lo.
No começo, tudo era muito vibrante. Eu me lembro de ir a testes na «gravadora» Decca e cada um de nós ter se saído muito bem, você sabe. Estávamos em um pub depois tomando algo e meio que desacelerando e saindo daquela euforia, mas ainda estávamos bem animados com aquilo. E eu me lembro de estar sentado no bar com George e isso acabou sendo algo engraçado para nós anos depois. Eu dizia, «em um tom de voz impressionado» ‘Quando você cantou ‘Take Good Care of My Baby‘ «de Goffin & King», foi incrível cara!’ Eu não tenho certeza se nós dizíamos ‘cara’ ou até mesmo ‘incrível’ naquela época, mas… foi um momento especial e tornou-se algo entre eu e ele: «voz de impressionado novamente» ‘Quando você cantou ‘Take Good Care of My Baby…’
George tocou uma violão clássico com cordas de nylon em ‘And I Love Her’. Eu me lembro de George ter curtido muito o trabalho de Andrés Segovia por um tempo. Você se lembra disso?
Eu acho que ‘por um tempo’ é a fase de progresso. Nós nos apaixonamos pela guitarra e não fazíamos diferença de tipo. Podia ser um violão espanhol, um violão clássico. Poderia ser um Gretsch, um Fender, um Gibson. Nós meio que amávamos a todas. Era como um sonho, era como andar pela fábrica do Papai Noel. Havia um forte ideia de maravilha para nós. Eu me lembro muito bem de estar no bar da mãe de Pete Best – o Casbah em West Derby em Liverpool – e George veio e abriu essa caixa longa e retangular. Nós não teríamos imaginado que havia uma guitarra ali porque na época você não via essas caixas longas e retangulares que agora são perfeitamente normais. Nós tínhamos visto estojos em forma de violão. E ele abriu essa caixa comprida e ali estava uma… não tenho certeza se era uma Fender. Eu acho que era uma réplica, uma cópia barata. Mas cara, era bonita. Tinha uma aparência tão gloriosa. Momentos como aquele eram muito especiais. Nós estávamos apaixonados pela guitarra, seja lá de que tipo fosse.
George e eu fazíamos esse lance, que é o lance J.S. Bach. Eu acho que se chama Fuga ou algo do tipo «ele canta ‘Bourrée’ de Bach em Mi Menor». Nós não a sabíamos inteira, mas aprendemos o comecinho. Nós inventamos o final. O que gostávamos nele era que era mais difícil do que as coisas que estávamos tocando, era parte de nosso desenvolvimento, porque eram duas linhas trabalhando uma contra a outra. Você tem a melodia «cantarola» e daí você tem meio que um «cantarolando» baixo trabalhando contra. Eu digo às plateias que foi aquilo que me deu a introdução de ‘Blackbird’. Não são as mesmas notas, mas eu peguei o estilo da melodia de baixo e a melodia aguda no mesmo trecho de guitarra e fiz a canção ‘Blackbird’ daquilo. Eu claramente lembro-me de George e eu sentarmos fazendo nossa própria versão da obra de Bach. Era meio que uma coisa de farra: ela algo para mostrar que nós não éramos apenas «faz uma voz pomposa» unidimensionais. Era um lance pra nos exibirmos. O que quero dizer é que sim, nós sempre nos ligamos em violonistas clássicos. Eu era um grande fã de Juliam Bream – que era um músico erudito bretão – e eu acho que George também o era.
Nós usávamos qualquer coisa na qual pudéssemos pôr as mãos atrás de ideias. Outra música muito influente era uma de Chet Atkins que tentamos aprender chamada ‘Trambone’. Essa é meio country. E é a mesma coisa – tem dois lances rolando. Você tem uma linha de baixo/grave e uma de agudos; Nenhum de nós realmente domino isso exceto por um cara chamado Colin «Mantley» do Remo Four «banda contemporânea de Merseybeat». Para nós aquilo era o ponto alto do show, quando Colin tocava esse instrumental. Mas o que eu digo é que todas as coisas adoráveis eram muito excitantes e nós as assimilamos em nossa música. Então nós com certeza não éramos esnobes.
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