Por Francisco Lima Jr.
RINGO STARR – The Beatles are Back!
Foi com esta chamada que a EMI detonou em 1973 a campanha mundial de promoção do novo álbum de Ringo, intitulado simplesmente “Ringo”. Apesar de ser apenas uma jogada de marketing, não deixa de ser uma meia-verdade, pois pela primeira vez desde a separação, os Beatles estavam reunidos novamente em um estúdio.
Em termos de lançamentos, 1973 foi um ano para nenhum Beatlemaníaco botar defeito. Em abril tivemos o lançamento dos álbuns The Beatles 1962/1966 (vermelho) e The Beatles 1967/1970 (azul), que alcançaram respectivamente o 3° e o 1° lugar na parada da Billboard. Em maio Paul lança o Red Rose Speedway e em junho George lança o Living in the Material World, ambos chegam facilmente ao 1° lugar. Quebrando a seqüência de primeiros lugares temos o Mind Games, de John, que lançado em novembro, alcança apenas o 9° lugar. Ainda em novembro é lançado Ringo e em dezembro, fechando o ano, Paul ataca com o Band on The Run. Ambos chegam ao 1° lugar.
Com uma pequena ajuda de seus amigos, Ringo faria aquele que seria considerado por ele seu primeiro álbum solo, seu primeiro trabalho realmente Rock’n’roll. Sentimental Journey (março/70) segundo o próprio é apenas uma viagem sentimental, onde ele canta velhos sucessos de sua adolescência, e Beaucoups of Blues (setembro/70) é um desfile de canções country, que todos sabem ser uma velha paixão de nosso querido Ritchie. Neste disco ele não toca sequer a bateria, se limita apenas a cantar.
Pelo seu caráter afetuoso e despretensioso, Ringo sempre foi o único capaz de reunir John, Paul e George em um único projeto. Já havia tocado antes nos álbuns Plastic Ono Band, All Things Must Pass, Concert for Bangladesh e Living in the Material World. Sabendo que Ringo, John e George estavam em Los Angeles gravando uma nova composição de John, chamada “I’m The Greatest”, que seria incluída no novo álbum do amigo baterista, Paul não quis ficar de fora e juntamente com Linda tomou um avião rumo a LA, levando no bolso uma canção intitulada “Six O’Clock”, considerada sua melhor balada desde “The Long and Winding Road”.
Em “I’m the Greatest” John recupera não só sua magia como também seu bom humor. Na época ele disse que se Cassius Clay ou ele próprio declarassem que eram os maiores, seriam tachados de pretensiosos, portanto achou melhor doar a canção para Ringo, pois assim todos a interpretariam como ele queria, ou seja, uma brincadeira. O tempo parece ter cicatrizado algumas feridas, e um John Lennon orgulhoso do seu passado declara em um dos versos: “I was in the greatest show on earth, for what it was worth”. A reunião dos três amigos em um mesmo estúdio suscita comentários sobre uma possível reunião dos Beatles, que infelizmente nunca aconteceu. Nesta canção Ringo ainda conta com a ajuda de Klaus Voormann e Billy Preston, que já havia tocado no antológico Let It Be.
“Have You Seen My Baby”, canção do grande compositor americano Randy Newman, tem além das participações de Klaus Voormann (baixo) e Jim Keltner (bateria) a presença de Marc Bolan, guitarrista de uma das melhores bandas do início dos anos setenta, o T. Rex. Nesta canção ouvimos dois solos, um de piano e outro de guitarra. O efeito é simplesmente fantástico. Infelizmente só ouviremos novamente dois solos em uma mesma canção em “Down and Out”, ótima composição de Ringo que é o lado B do single “Photograph”.
George antes já havia ajudado Ringo a compor “Octopus’ Garden”, como ficou demonstrado no filme Let It Be, e agora o ajudaria novamente na composição de “Photograph”, onde contribuiu com uma bela melodia. O trabalho de parceria Starkey/Harrison não poderia ser melhor e o resultado não poderia ser outro: 1o lugar e dezesseis semanas no topo.
“Sunshine Life For Me”, composta por George, narra a estória de um cara que prefere viver no campo com as árvores a se relacionar com pessoas. Não chega a ser um country, mas faz uso de alguns instrumentos tipicamente usados em neste tipo de música, como o banjo, bandolim e acordeon. Apesar de não ser uma das melhores coisas já compostas por George, não chega a comprometer o disco.
Com “You’re Sixteen” temos mais um 1° lugar de nosso querido Ringo, que atônito com tanto sucesso, parecia não acreditar, e modestamente creditava os dois primeiros lugares na dificílima parada americana a um golpe de sorte. Os arranjos ficaram a cargo de Paul, que também fez o solo de sax, imitando o som do instrumento com a boca. Temos ainda as participações de Harry Nilson nos backing vocals e Nicky Hopkins nos teclados. “You’re Sixteen” permaneceu quatorze semanas nas paradas.
Com “Oh My My” surgiria a parceria Richard Starkey/Vini Poncia que mais tarde escreveria vários sucessos. O arranjo da bateria lembra um pouco o que Ringo fez para “Get Back”. Lançada como single atinge o 5º lugar, provocando uma verdadeira overdose de Ringo na programação das rádios. Depois de ouvir tantas canções do amigo, John, que até então não havia conseguindo nenhum 1o lugar, lhe enviou o seguinte telegrama: “Congratulations. How dare you? And please write me a hit song” (Parabéns! Como ousa? E por favor me escreva uma canção de sucesso).
Escrita exclusivamente por Ringo, “Step Lightly” reúne no mesmo estúdio uma nata de músicos do calibre de Steve Cropper (guitarra), Nicky Hopkins (piano), Tom Scott (clarinete) e Klaus Voormann (baixo). Apresenta ainda um solo de sapateado de Ringo.
Como já havia comentado antes, “Six O’Clock” é uma das melhores baladas já escritas por Paul. Letra, música, arranjos, tudo se encaixa maravilhosamente bem. Além de tocar piano, sintetizador e fazer junto com Linda os backing vocals, ele ainda fez os arranjos de cordas. Existe uma versão mais longa que foi oficialmente lançada como faixa bônus na edição em CD do álbum Goodnight Vienna.
“Devil Woman” é mais uma parceria da dupla Starkey/Poncia. É uma das melhores do disco, começa com uma bateria pesada e uma levada de guitarras. No meio temos um solo de Ringo. Há uma citação a “Sexy Sadie”, mas não tem nada a ver com o Maharishi.
Encerrando o disco temos a belíssima “You and Me (Babe)” que é fruto de uma estranha parceria entre George e o antigo roadie dos Beatles, Mal Evans. Os agradecimentos de Ringo no final são comoventes, e quando ele cita George Harrison, John Lennon e Paul McCartney não dá para resistir.
Se não conseguiu reunir os Beatles totalmente, pelo menos na capa Ringo conseguiu esta façanha. Vemos lado a lado Paul & Linda, John & Yoko e George, além de todos os amigos que participaram do disco. A capa lembra muito a do “Sgt. Pepper” e todas as letras vêm acompanhadas de uma bela gravura pintada por Klaus Voormann, que retrata um pouco o que está escrito.
Na versão em CD temos três faixas bônus. A primeira delas, “It Don´t Come Easy” foi composta pelo próprio Ringo com uma pequena ajuda de George. Lançada em abril de 1971, não só mostrou para os incrédulos que Ringo poderia ter uma vitoriosa carreira solo, como também conseguindo um disco de ouro, suplantou os singles “Another Day” (Paul), “Power To The People” (John) e “Bangla Desh” (George).
“Early 1970” , lado B de “It Don’t Come Easy”, tem uma forte influência de George. Apesar de ser uma canção creditada apenas a Ringo, certamente tem o dedo de George nela, como demonstra o solo de slide guitar. Finalmente temos “Down and Out” que como já comentei antes foi o lado B do single “Photograph”. É uma canção fortíssima, e na minha opinião deveria ter sido lançada no próprio álbum “Ringo”, no lugar de “Sunshine Life For Me” ou “Step Lightly”.
Depois deste disco, Ringo passou a ser visto com outros olhos. Todos pensavam que com o fim dos Beatles, sua carreira musical também teria terminado. Enfim, Ringo chegou onde chegou porque não tinha que provar nada a ninguém, não tinha que salvar o mundo ou nossas almas, tinha apenas que ser ele mesmo e agir naturalmente.