Por Claudio Teran
Quando olhamos para as fotos dos Beatles que todos temos, é provável que não nos apercebamos que em geral elas não tem tempo e nem lugar. Os Beatles ficaram eternizados nas fotos que fizeram por conta do carisma, do brilho nos olhos, da aura iluminada. Então olha-los na capa do Beatles For Sale: soa como eternidade.
Ocorre o mesmo quando os observamos nas roupas do Sgt.Peppers ou na capa do Let it Be. Tudo isso é para dizer que é algo estranho falar de um Beatle que está com 62 anos de idade cravados nas costas.
É muita vida para um rockeiro? Depende de qual vida estamos analisando. Do alto do posto de cidadão do mundo, Ringo Starr é Peter Pan, e o Planeta Terra a sua terra do Nunca. Ou seja: ele não ficará velho nem quando fizer a última curva da existência. Do ponto de vista dos mortais comuns, Richard Starkey avança pelo mundo dos sexagenários sim. Sendo porém um velho muito diferente. Um velho que toca bateria da forma como tocava quando novo. Mais lento é provável. Mas com o tempo certo o tempo todo como reza o básico da cartilha dos bateras que se prezam. Esse Richard também é um velho em forma, sem barriga, aparentando menos que a idade real, com o cabelo e a barba vaidosamente aparados na mesma altura.
Quem é Ringo Starr aos 62 anos? A meu ver, um dos nossos heróis. Uma lenda viva autêntica. Quase único porque divide com Paul McCartney a posição de Beatle-Matéria nesse plano da existência. Do mundo material os outros dois se foram, e nada pudemos fazer para impedir. Que Deus mantenha Ringo Starr, então. Um verdadeiro beatle fã – sobretudo àqueles que acompanham os Fabs há anos, não tem o direito de olhar fotografias recentes e exclamar: “nossa como Ringo(ou Paul) está(ão) velho(s)!” Ora essa. É provável que essa turma não tenha espelho em casa para notar que vem envelhecendo com os ídolos porque o tempo não pára para ninguém.
Ringo Starr demonstra ser um homem feliz, realizado, apaixonado e de ótimo astral. Seu maior drama pós-Beatles foi o alcoolismo. Questão que ele conseguiu vencer. A carreira-solo é considerada irregular pela crítica. Mas que outro baterista no mundo do rock and roll pelo menos, tem tantos discos gravados? Qual outro baterista de qualquer gênero tem a fama de Ringo? Quem conhece bateristas capazes de saírem em sucessivas turnês mundiais como Ringo Starr??? Aos 62 anos de idade, e levando vida de milionário, Mr.Starkey está pouco ou nada preocupado com isso. Mas na minha avaliação, o mundo deveria estar. Aquí e ali ainda há quem questione o talento e a competência desse vencedor. Ora. É como achar que Ronaldo Nazário não teve méritos em sair goleador da copa do mundo, numa competição onde disputou a artilharia com atacantes de 32 países – alguns em melhor forma física que ele.
O mundo faria um bem danado a Ringo Starr se aproveitasse seus 62 anos para reconhece-lo verdadeiramente. Por que não, Sir Ringo Starr? Deram esse título honorífico para alguém como Cliff Richard! Paul McCartney e George Martin também foram agraciados. Se há outro beatle vivo, porque não homenagea-lo agora? Em vida? E que tal acabar-se pelo menos no nosso portal – e de uma vez – as discussões estéreis de que “Ringo era o menos dotado, Ringo não é um grande baterista”, e uma saraivada de outras bobagens. Convenhamos. Ringo Starr está com 62 anos! É famoso há 42! Notem bem. Não estou pregando comiseração. Mas reconhecimento. Esse homem para mim é tão grande quanto John, Paul, e George.
Seu pulsar na Ludwig mexeu com milhões de pessoas. Você pega Simon Kirke, ex-Bad Company, e que tocou a segunda bateria em duas edições da All-Starr Band e ele é enfático ao revelar: “sou baterista por causa de Ringo Starr.” Posição dividida por outro fã, João Barone, dos Paralamas do Sucesso. Sei que nosso maestro Beto Ianicelli é mais afeito às cordas. Mas aproveito a oportunidade para lançar-lhe de público um doce desafio. O de escrever um ensaio técnico revelando toda a eficiência de Ringo Starr do ponto de vista de quem realmente entende da coisa porque é acostumado a tocar e a dividir emoções e responsabilidades com outros músicos nos palcos.
Imagino que ele, com sua sensibilidade saberá transmitir tudo o que não consigo dizer dada a incapacidade absoluta de extrair acordes de uma guitarra, ou de fazer rufar os tambores. Imagino que ele haverá de explicar que para ser grande por trás de um kit de tambores não é necessário ser espalhafatoso como Eric Carr, do Kiss e seus 17 tom-tons.
Vou contar uma breve história para fechar essa narrativa. O grande Charlie Watts, dos Rolling Stones, formou uma jazz band há alguns anos. Saiu em turnê pelo mundo. O trabalho era ótimo, mas a tour foi um fracasso porque as pessoas não saíam de casa para ver uma apresentação-solo do baterista dos Rolling Stones. O fenômeno ocorreu inclusive no Brasil, abreviando sua meteórica passagem por São Paulo.
Se Ringo Starr viesse ao Brasil ocorreria a mesma coisa? Fiquem certos que não. Nós estaríamos lá. Se o Beatles Brasil fosse em peso, o evento teria de sair de um teatro para um estádio. Veríamos sim outros músicos no palco com ele porque afinal nenhum batera pode sair por aí e subir ao palco sozinho com seu instrumento. Mas lá do alto, quando ele assumisse o kit para entoar Boys pela milionésima vez estaríamos diante de um beatle vivo em ação. Famoso, importante, talentoso e carismático como os demais.
É esse homem para mim que completa 62 anos neste julho…
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